segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Precificação do Índice Bovespa

Até agora eu somente foquei a precificação (valuation) da carteira do SPX. Chegou o momento de falar do índice Bovespa.

Com a globalização financeira houve a queda das barreiras dos fluxos financeiros e, conseqüentemente, foi possível a arbitragem dos preços das ações, um fenômeno semelhante ao dos vasos comunicantes na física.

Antes da vigência do Anexo 4 em 1991 (editado no governo Collor), o fluxo para a bolsa sofria restrições e por isso o Múltiplo era a metade do atual. Imagine o que poderia acontecer com os preços das ações na hipótese pouco provável, levantada apenas a título de ilustração, da volta das antigas restrições ao fluxo. Seria um desastre.

Uma eventual centralização do câmbio, por exemplo, hipótese comentada recentemente nos jornais por um economista sem ter o que fazer, teria o mesmo impacto, pois o livre fluxo financeiro deixaria de existir. Como vimos no exercício feito no texto anterior, uma eventual nova onda de debandada dos estrangeiros da bolsa e da renda fixa causaria um impacto bem menor sobre as reservas cambiais do que no início do semestre.

Como se dá então a arbitragem dos preços das ações entre os mercados? Via o Múltiplo. Veja o quadro abaixo que mostra a relação entre o earnings yield da carteira do índice Bovespa (lucro líquido dividido pelo preço da ação ou o inverso do Múltiplo histórico) e o do SPX acrescido do Risco Brasil (EMBI Brasil).


Fonte: KB

A correlação entre o inverso do Múltiplo (earnings yield) do índice Bovespa e da soma do Risco Brasil e o inverso do Múltiplo do SPX nos últimos anos foi em torno de +80%, portanto bem significativa. O modelo acima não incorpora a diferença entre as taxas de juros nos EUA e em nosso país, no entanto, a sua influência é bem menor do que a do Risco Brasil, além do que a regressão linear obtida do quadro acima incorporaria uma média da diferença de taxas no período.

Uma vez obtido o Múltiplo justo para o índice Bovespa, para se calcular o seu preço justo seria necessário multiplicá-lo pelo lucro médio projetado da carteira do índice Bovespa pelos analistas (P = M x L), não sem antes avaliar a consistência das projeções.

Nessa última sexta-feira o Múltiplo da carteira do SPX de 18,4 vezes estava muito fora do esquadro em relação ao meu modelo, que mostra um valor de 16,1 bem como do modelo do Bear Stearns de 12,9 vezes. No entanto, se o Múltiplo de 18,4 vezes do SPX fosse aceito, o Múltiplo justo para o Bovespa seria atualmente de 10,3 vezes.

Lembre-se que cada vez que o Risco Brasil aumentar, como tem acontecido, o Múltiplo deveria cair, pois o earnings yield da carteira do Bovespa teria que ser mais competitivo.

As diversas modelagens que ao longo do tempo eu fui criando gerou um resultado muito interessante. No lugar de eu prestar exagerada atenção às divergências dos indicadores e osciladores técnicos, como o Índice de Força Relativa, Macd entre outros, embora eu nunca deixe olhá-los, eu passei a dar um enorme peso às divergências, positivas e negativas, entre o comportamento do índice Bovespa e as variáveis dos meus diversos modelos.

Por exemplo, bem antes do pico em maio, o Risco Brasil já não mais registrava novas mínimas e por esse motivo não chancelava a euforia que perdurou até aquele mês. Uma divergência negativa, não encontrada nos manuais da AT (análise técnica), mas extraída dos modelos macroeconômicos.

A divergência negativa revelada pelo Risco Brasil começou a ficar visível em torno dos 56 K, um pouco antes do pico em julho de 2007, quando houve um tremor na bolsa brasileira. A sua sinalização não foi um primor em termos de timing, pois antecipou em 10 meses o pico assinalado em maio de 2008, uma sinalização muito prematura para um trader de curto prazo.

Apesar disso, essa divergência negativa deixou em estado de alerta os mais atentos, e os que não duvidaram do óbvio. Embora o exemplo do Risco Brasil não ter sido o mais eficiente, há outros exemplos de indicadores macroeconômicos, emprestados dos diversos modelos, muito mais eficazes do que o Risco Brasil em termos de timing.

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