segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O Ajuste Bancário

No 1o. mês do TiB eu citei números, tendo como fonte Martin Wolf do Financial Times, sobre o endividamento (alavancagem ou leverage) total dos agentes públicos e privados nos EUA que atingiu recorde na história daquele país em 2008, ao assinalar cerca de 355% do Pib.

O endividamento do setor bancário, por seu turno, também atingiu um recorde de 116% do Pib, tendo partido de apenas 20% no começo da década de 80, segundo essa fonte. Somente o endividamento das GSEs (Government Sponsored Enterprise) Fannie Mae e Freddie Mac, que detinham cerca de US$ 6 trilhões em ativos hipotecários, representavam cerca de 40% do Pib.

Na hipótese de que os ativos das 2 GSEs eram iguais aos seus passivos, apenas a assunção pelo Tesouro dos compromissos dessas 2 empresas hipotecárias representou uma redução de um pouco mais de um terço do endividamento do setor bancário.

Na época houve um grande receio de que os EUA pudessem perder a classificação de Aaa. No entanto, a sorte foi que o endividamento líquido do setor público federal era razoavelmente baixo, algo em torno de uns 45% a 50% do PIB. Porém, as necessidades de funding do Tesouro são ditadas pelo endividamento bruto e não pelo líquido, sendo que o primeiro aumentou em cerca de US$ 6 trilhões com a assunção das 2 GSEs.

O gráfico abaixo mostra a evolução, desde meados da década de 90, da alavancagem do setor bancário norte-americano e europeu. Nesse caso, a alavancagem é medida pelo fator conhecido por tangible equity ratio ou seja, a razão entre o patrimônio líquido deduzido dos ativos intangíveis, como goodwill, e o ativo total do setor bancário.


Fonte: Morgan Stanley

Como se pode notar pelo gráfico acima, o setor bancário norte-americano teve a sua alavancagem substancialmente reduzida, enquanto o setor bancário europeu mal começou essa jornada, uma péssima notícia para a zona do Euro. Pelas minhas contas, no caso do setor norte-americano, cerca de 80% da redução da alavancagem foi graças à ajuda do Tesouro e o restante devido à forte diminuição das operações bancárias.

Se o setor bancário não conseguir reduzir o tangible equity ratio via vultosas captações recursos no mercado acionário, essa redução continuará sendo feita na forma de redução do lado esquerdo do balanço, ou seja, através de vendas forçadas de ativos (fire sale), alternativa que tem pressionado em demasia todos os mercados, inclusive os acionários.

A maioria dos economistas projeta uma recuperação da economia norte-americana na forma de um L, ou seja, uma queda brusca da atividade econômica seguida de uma recuperação anêmica. Como o próprio Morgan Stanley reconhece, mesmo no caso dos EUA, há ainda um caminho a percorrer no processo de redução da alavancagem bancária.

A normalização das operações bancárias será crucial para identificarmos o término da queda vertical (a 1ª parte do L) e, consequentemente, do início da recuperação que se espera ser anêmica, projeção com a qual eu compartilho.

Para identificarmos esse momento, eu particularmente estarei de olho no spread entre a Libor de 3 meses (taxa cdi entre os bancos) e o derivativo Overnight Indexed Swap (OIS = estimativa da taxa básica ou fed funds por um determinado período) do mesmo prazo, no Ted Spread e, especialmente, no comportamento das ações do setor e do spread dos títulos de alto risco (junk bonds). O meu palpite é que todos esses indicadores irão mudar de direção simultaneamente.

O retorno à taxa histórica de crescimento dos EUA, entre 3,2% aa a 3,5% aa, ficará condicionado à redução do endividamento das famílias, processo que irá levar bem mais tempo. O acompanhamento do setor imobiliário irá servir de valiosa pista nesse sentido.

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